5.7.07

NOTA TÉCNICA DO GRUPO CONSULTIVO DAS HEPATITES VIRAIS DO DISTRITO FEDERAL.

NOTA TÉCNICA RELATIVA ÀS DIRETRIZES PARA
O TRATAMENTO DA HEPATITE VIRAL B CRÔNICA



1. Esta norma foi elaborada com base na Portaria MS
860 de 04 de novembro de 2002, no Consenso da Sociedade Brasileira de Hepatologia de agosto de 2005 e no Consenso da Sociedade Brasileira de Infectologia de agosto de 2006, e manejo do paciente com hepatite B (Lok e McMahon, 2007) e nas sugestões dos membros do Grupo Consultivo das Hepatites Virais do Distrito Federal.

2. Classificação
CID B18.0 – Hepatite Viral Crônica com agente delta
CID B18.1 – Hepatite Viral Crônica sem agente delta

3. Critérios de Inclusão
Serão incluídos no Protocolo de Tratamento aqueles pacientes que se enquadrarem nos seguintes critérios:
3.1. Critérios básicos para todos pacientes:
• Idade superior a 2 anos;
• HBsAg positivo no soro por mais de 6 meses;
• Elevação persistente ou intermitente de ALT/AST (exceto nos casos de ALT normal com doença hepática avançada).
• Ausência de contra-indicação ao tratamento.
• Termo de consentimento informado assinado.




3.2. Critérios para condições específicas:

a) Pacientes HBsAg e HBeAg positivos:
• HBV DNA > 20.000 UI/ml (105 cópias/ml) e ALT elevada (≥ 2x valor superior da normalidade);
• HBV DNA 2.000 a 20.000 UI/ml (104 - 105 cópias/ml), ALT normal e biópsia hepática com atividade necro-inflamatória moderada a intensa e/ou fibrose moderada a intensa (≥ a A2 e/ou ≥ a F2 da Classificação Metavir e App ≥2 e E≥2 da Sociedade Brasileira de Patologia);

b) Pacientes HBsAg positivo e HBeAg negativo:
• HBV DNA ≥ 20.000 UI/ml (105 cópias/ml), independente do valor de ALT e biópsia hepática com atividade necro-inflamatória moderada a intensa e/ou fibrose moderada a intensa (≥ a A2 e/ou ≥ a F2 da Classificação Metavir e App ≥2 e E≥2 da Sociedade Brasileira de Patologia);

c) Pacientes com HBsAg positivo e cirrose hepática:
• HBeAg positivo ou negativo com HBV DNA ≥ 20.000 UI/ml (105 cópias/ml);
• HBeAg positivo ou negativo, independente do valor de DNA que estejam em lista de transplante hepático;
• HBV DNA 2.000-20.000 UI/ml (104 -105cópias/ml) com cirrose hepática compensada;
• Todos pacientes com cirrose descompensada, independentemente dos valores de ALT ou HBV DNA;
• HBV DNA < 2.000 UI/ml (104 cópias/ml) com cirrose hepática compensada (considerar tratamento ou monitorar a cada 3 meses no primeiro ano de seguimento, depois a cada 6-12 meses).

d) Pacientes co-infectados com vírus Delta (VHD):
HBsAg positivo, anti-delta e HDV RNA pelo PCR
Qualitativo positivo:
• Considerar o tratamento a partir do diagnóstico, exceto em cirrose hepática descompensada.

d) Pacientes co-infectados com vírus da hepatite C (HCV)
positivo: HBsAg postivo, antiHCV positivo e HCV RNA pelo PCR Qualitativo positivo:
• Tratar conforme as diretrizes para o tratamento da hepatite viral C.

e) Pacientes co-infectados com vírus HIV: HBsAg positivo e HIV positivo:
• Tratar independentemente do estado imunológico do paciente.
• A biópsia hepática é fundamental na condução do caso, devendo ser realizada teoricamente em todos os pacientes co-infectados.
• Em caso de uso ou necessidade de tratamento anti-retroviral para o HIV, ajustar o esquema com a combinação de drogas com efeito inibidor sob a replicação dos dois vírus (exemplo: Tenofovir).
• Se o tratamento com IFN for considerado observar valor de CD4 (abaixo de 200 céls. contra-indicar o IFN)

f) Pacientes pós-transplante hepático:
• Manutenção do tratamento, seguindo orientação de protocolo do serviço responsável pelo transplante hepático.

g) Pacientes com HBsAg positivo em renais crônicos:
• Mesmos critérios de indicação aos portadores de hepatite B.
• Nos casos de pacientes renais crônicos em espera para o transplante renal sem indicação de tratamento do VHB, ou seja, sem evidência de replicação viral ou sem atividade necro-inflamatória ou fibrose signifiocativas ao estudo histológico, é recomendável tratamento profilático (HBV DNA indetectável) ou preemptivo (HBV DNA detectável) com lamivudina, com objetivo de reduzir o risco de reativação da hepatite B no pós-transplante. Idealmente, o tratamento deve ser iniciado cerca de 3 meses antes do transplante renal, o que nem sempre é possível, sobretudo nos casos de transplante com doador cadáver. Nestes casos, o tratamento deve ser iniciado assim que o paciente for contactado para a realização do transplante.

h) Pacientes com HBsAg positivo pós-transplante renal:
• HBsAg positivo com HBeAg positivo ou HBeAg negativo com HBV DNA ≥ 2.000 UI/ml (104 cópias/ml/) ou biópsia hepática com atividade necro-inflamatória moderada a intensa e/ou fibrose moderada a intensa (≥ a A2 e/ou ≥ a F2 da Classificação Metavir e Sociedade Brasileira de Patologia).

4. Tratamento.

4.1. Objetivos:
O tratamento da hepatite B crônica tem como objetivo alcançar a supressão sustentada da replicação do HBV e remissão da doença hepática. Alcançando a meta principal de prevenir a evolução para cirrose, insuficiência hepática e carcinoma hepatocelular.

4.2. Parâmetros para acessar a resposta terapêutica:
• Normalização da ALT
• Redução dos níveis séricos de HBV DNA
• Perda do HBeAg com ou sem a detecção do antiHBe
• Melhora na histopatologia hepática

São considerados pacientes com mau perfil de resposta terapêutica os cirróticos, mais idosos, portadores de co-morbidades e alta carga viral.
Considera-se terapêutica substitutiva, combinada ou seqüencial àqueles pacientes submetidos ao tratamento inicial configurando não-respondedores aos interferons, não-respondedores aos antivirais e os que desenvolveram resistência aos antivirais inicialmente utilizados.

4.3. Definições de resposta terapêutica:
• Bioquímica: normalização da ALT.
• Virológica: redução do HBV DNA para níveis indetectáveis aos testes de PCR e negativação do HBeAg em pacientes previamente positivos.
• Histológica (Avaliação não obrigatória): redução do index de atividade histológica em pelo menos 2 pontos, sem evidências de progressão da fibrose comparado ao exame histopatológico pré-tratamento.

4.4. Medicamentos – Classificação, apresentações e esquemas de administração:

4.4.1. Interferons:

Os interferons apresentam ação antiviral, antiproliferativa e efeitos imunomoduladores. Tem sido demonstrado a eficácia do interferon alfa na supressão da replicação do HBV e na redução da doença hepática.
Os dois fatores mais consistentemente associados à resposta aos interferons são baixos níveis basais de HBV DNA e elevados níveis basais de ALT (≥5 x limite superior da normalidade). Outros fatores possivelmente associados à maior probabilidade de resposta são: curto período de infecção, infecção adquirida na idade adulta e sexo feminino.
Tendo como vantagem o tratamento por tempo definido (48-52 semanas), entretanto com o surgimento de vários efeitos colaterais, além de contra-indicados em pacientes portadores de cirrose hepática descompensada.

A) Interferon alfa (convencional):
• Adultos: 4.500.000 a 5.000.000 UI diariamente ou
9.000.000 a 10.000.000 UI três vezes por semana, aplicação via subcutânea.
• Crianças: 6.000.000 UI/m2 (máximo de 10.000.000) três vezes por semana. A dose deve ser reduzida nos casos de supressão da medula óssea ou febre (ocorre em 20% dos casos).
• Duração: HBeAg positivos período de 16-24semanas
HBeAg negativos período de 52 semanas

B) Interferon Peguilado alfa-2a:
• Doses de 180 mcg por semana por 48 semanas.


4.4.2. Análogos de Núcleos(t)ídeos:

Os análogos de nucleos(t)ídeos são medicamentos de administração oral, com excelente ação inibitória sobre a replicação viral, porém com alto índice de exacerbação e de recidiva após sua interrupção.
Podem ser utilizados em pacientes portadores de cirrose hepática, mesmo em casos graves de doença avançada. Tem também sido demonstrado a segurança do uso de Lamivudina em pacientes grávidas, HBeAg positivas e com alta carga viral, no intuito de reduzir os índices de transmissão vertical, acompanhadas das medidas profiláticas ao recém-nascido (vacinação passiva e ativa no nascimento).
Os análogos de núcleos(t)ídeos devem ser prescritos pelo prazo inicial de hum ano, devendo ser mantidos até que ocorra a soroconversão. Depois da soroconversão, manter por mais seis meses para melhorar a chance de resposta sustendada. Exceto nos pacientes portadores de cirrose hepática avançada que apresentam tempo indeterminado de uso.
A utilização de análogos de núcleos(t)ídeos possui como conseqüência o potencial aparecimento de resistência ao VHB. Sendo recomendado criteriosa seleção dos antivirais no tratamento inicial e em suas substituições ou combinações à posteriori, devendo ser utilizados agentes capazes de suprimir o HBV DNA para o menor nível possível, com intuito de prevenir ou pelo menos retardar a emergência de cepas droga-resistentes. Portanto, para terapêutica de longo prazo ou prazo indefinido, outros análogos de nucleos(t)ídeos devem ser preferidos à lamivudina (monoterapia), devido apresentarem melhores perfis de resistência.
A caracterização da resistência se dá pelo incremento do HBV DNA – 1 log10 em relação ao nadir obtido – caracterizando o breaktrhrough virológico, seguida da elevação da ALT e, eventualmente, da reversão dos benefícios histológicos e progressão e/ou exacerbações da doença hepática.
Pacientes co-infectados com o HIV possuem um risco maior de esteatose hepática e acidose lática por determinados análogos de núcleos(t)ídeos, provavelmente por toxicidade mitocôndrial, que pode ocorrer após anos de terapêutica.
Pacientes portadores de hepatite B crônica e insuficiência renal (clearence da creatinina <50ml/min) devem ter as doses dos análogos de núcleos(t)ídeos ajustadas conforme a tabela em anexo*.

A) Lamivudina:
• Adultos: com função renal normal (clearence da creatinina >50ml/min) e sem co-infecção pelo HIV : 100-150mg diariamente, por via oral, por período inicial de 01 (hum) ano, podendo ser mantida até que ocorra a soroconversão. Neste caso, deve ser mantida ainda por mais 06 meses, no intuito de melhorar a chance de resposta sustentada.
• Crianças: 3mg/kg/dia (máximo de 100mg/dia)
• Pacientes portadores de insuficiência renal crônica: ajustar doses conforme tabela em anexo*.
• Após a suspensão da Lamivudina o paciente deve ser monitorizado freqüentemente com ALT e, quando disponível, com HBV DNA.
• Quando da não ocorrência da soroconversão deve ser mantida enquanto não ocorra evidência de resistência à droga.

B) Adefovir dipivoxil:
• Dose de 10 mg diariamente, por via oral e a duração do tratamento ainda é indeterminada, porém sugere-se que seja mantida até a soroconversão.
• Doses mais altas devem ser evitadas em virtude do efeito adverso de nefrotoxicidade.

C) Entecavir:
• Doses de 0,5 mg diariamente, por via oral, e a duração do tratamento ainda é indeterminada, porém sugere-se que seja mantida até a soroconversão.
• Em caso de pacientes com resistência à lamivudina, utilizar doses de 1,0 mg diariamente.
• Em caso de paciente co-infectado por HIV/HBV que não esteja recebendo terapia antiretroviral altamente ativa (HAART), a possibilidade de desenvolver resistência ao HIV não pode ser excluído com base nas informações atuais.

D) Telbivudina:
• Doses de 600mg diariamente por via oral, e a duração do tratamento ainda é indeterminada, porém sugere-se que seja mantida até a soroconversão.
• Interação medicamentosa com drogas que alterem a função renal, em virtude de ser eliminado primariamente por excreção renal. Reduzir doses em insuficiência renal conforme tabela em anexo.
• Evitar amamentação durante uso da medicação.
• Segurança e eficácia em pacientes transplantados ou em menores de 16 anos ainda permanecem desconhecidas.
• Acidose láctica e hepatomegalia severa com esteatose foram relatados com o uso isolado de análogos de núcleos(t)ídeos ou em combinação aos antiretrovirais.
• Miopatias podem surgir após várias semanas ou semanas de início do tratamento, podendo ser suspendido ou descontinuado na confirmação diagnóstica.



5) Logística:
Por razões de controle da secretaria de vigilância sanitária, além da otimização e monitorização da adesão ao tratamento, aqueles pacientes que tiverem indicação de tratamento com interferon, peguilado ou não, devem ter suas doses aplicadas em serviço especialmente identificado para tal fim pela Secretaria Estadual de Saúde. Em caso de dificuldades ou impossibilidade para tal, devem ser esclarecidos ao paciente as condições de armazenamento e assegurado a dispensação adequada de agulhas e seringas, seguindo todas as normas da vigilância sanitária com relação ao destino de material patológico.

6) Consentimento Informado.
É obrigatória a cientificação do paciente ou de seu responsável legal, dos potenciais riscos e efeitos colaterais relacionados ao uso dos medicamentos preconizados para o tratamento da hepatite viral crônica B, o que deverá ser formalizado por meio da assinatura de Termo de Consentimento Informado, de acordo com o modelo publicado na Portaria do Ministério da Saúde 862/2002.

7) Recomendações para monitorar os pacientes com infecção crônica pelo VHB inicialmente não considerados para tratamento:

A) Portador Inativo do HBsAg, assim caracterizado:
- HBsAg positivo por mais de 6 meses
- HBeAg negativo ou anti-HBe positivo
- HBV-DNA < 2.000 UI/ml (104 cópias/ml)
- ALT/AST persistentemente normais
- Biópsia hepática confirmando ausência de doença hepática significativa
• Monitorar o ALT a cada 3 meses para confirmar a permanência do estado de portador inativo e depois a cada 6-12 meses, pois em alguns casos pode haver a reativação e progressão da doença hepática.

B) Portador HBeAg positivo com HBV DNA elevada porém com ALT persistentemente normal:
• Monitorar a intervalos de 3-6 meses o ALT e de 6-12 meses o HBeAg.
• Biópsia hepática geralmente não é necessária em pacientes jovens (>30 anos) HBeAg positivo e ALT persistentemente normal.

C) Portadores crônicos do VHB considerados com maior risco para o desenvolvimento do carcinoma hepatocelular (CHC)
– maior tempo de infecção pelo VHB, cirróticos, história familiar de CHC, persistente/intermitente elevação de ALT e/ou HBV DNA (>2.000 UI/ml)
- devem realizar, preferencialmente associados, a ultrassonografia abdominal e a dosagem da alfa feto proteina em intervalos de 6-12 meses.

D) Portadores de hepatite B crônica com fatores associados ao maior risco de evolução para cirrose hepática:
• Idade avançada (maior duração da infecção)
• Elevados níveis de HBV DNA
• Genótipo C
• Consumo regular/abusivo de bebida alcoólica (>20g/dia para mulheres e >30g/dia para homens)
• Co-infecção com VHD, VHC ou HIV.


* Tabela - Análogos de núcleos(t)ídeos em renais crônicos.
Ajuste de dose para adulto de acordo com o clearence
da creatinina:


a. Lamivudina
Clearence da creatinina (ml/min) Dose Recomendada
≥50 100mg/dia
30-49 100mg 1a.dose, depois 50mg/dia
15-29 35mg 1a.dose, depois 25mg/dia
5-14 35mg 1a.dose, depois 15mg/dia
<5 35mg 1a.dose, depois 10mg/dia

b. Adefovir
Clearence da creatinina (ml/min) Dose Recomendada
≥50 10mg diariamente
20-49 10mg dias alternados
10-19 10mg a cada 3 dias
Pacientes em Hemodiálise 10mg semanalmente após diálise

c. Entecavir (naïve e refratário/resistente à Lamivudina)
Clearence da creatinina (ml/min) Dose Recomendada
≥50 0,50mg/dia –1,0mg/dia
30-39 0,25mg/dia - 0,5mg/dia
10-29 0,15mg/dia - 0,3mg/dia
<10 ou hemodializado* ou diálise peritoneal ambulatorial contínua 0,05mg/dia - 0,1mg/dia

d. Telbivudina
Clearence da creatinina (ml/min) Dose Recomendada
≥50 600mg/dia
30-49 600mg a cada 48 horas
<30 600mg a cada 72 horas
Disfunção Renal Terminal 600mg a cada 96 horas
*Administrar após hemodiálise

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